CEBs E AS PEQUENAS COMUNIDADES ECLESIAIS

Créditos de Pe. José Marins

 

III. O AGIR

 

  1. A partir da Igreja local

 Cada época, cada cultura, cada Igreja local (povo de Deus com seu Bispo e seus ministros):

  • 1) experimenta Deus;

  • 2) responde ao Espírito que lhe dá graça para sua missão, em sua realidade (contexto). O Espírito de Deus trabalha no coração da história,

  • a) em cada uma de suas conquistas;

  • b) em cada comunidade eclesial;

  • c) em cada pessoa - com a graça (inspiração, vocação) que necessita para sua vida e sua missão - de acordo com a vocação de ser fermento e primícia do Reino de Deus e de um novo povo de Deus.

 

 A Igreja local não pode ser prisioneira de:

  • a) uma cultura;

  • b) um modelo histórico;

  • c) uma época;

  • d) uma teologia;

  • e) um grupo carismático;

  • f) uma concepção de comunidade eclesial.

  

Com efeito, a cultura, o modelo, a teologia, os grupos, as concepções históricas não representam a Igreja em plenitude. São uma tentativa limitada de resposta (teológico-pastoral). A revelação se manifestaem cada cultura (língua). O Cristo manisfestado em cada Igreja é a plenitude de uma cultura.

 

A Igreja local tem a graça de Deus para sobreviver sem seus fundadores ou líderes especiais, porém não os esquece e os ‘atualiza' em cada nova realidade, e época. O importante não é perseverar, mas corresponder de maneira criativa, a partir da fé, às novas exigências das realidades (não se trata de uma perseverança de cemitérios). Ser fermento não é ser cimento. Não é preciso renunciar aos sonhos, apesar dos pesadelos.

 

 

  1. Motivação Geral

A motivação geral tem, especialrmente, como conteúdo: o Mistério de Cristo; as primeiras comunidades cristãs do Novo Testamento; a Igreja sacramento, o discipulado e a missão que dá vida; o Vaticano II e as Assembleias Latino-americanas e Caribenhas.

 

O modelo encarnado pelas CEBs tem assim seus eixos centrais; prioridades; estruturas; metodologia participativa e espiritualidade, que influem em tudo o que fazem: eventos, sacramentos, catequese, homilias, publicações etc.

 

 

  1. Formação

Para este novo caminhar eclesial é necessária uma atualizada formação bíblica  Cristológica (que retoma a dimensão do Jesus histórico, especialmente, em seu ministério e  fidelidade absoluta a Deus e a sua missão), Eclesiológica (Igreja sacramento, primícia e mediação do Reino) e também formação atualizada sobre técnicas e dinâmicas para trabalhos com  grupos e com multidões.

 

Em tudo o que se faz na vida paroquial - eventos, sacramentos, catequese, homilias, publicações - têm que estar subjacentes os grandes temas teológicos: Reino de Deus; Ministério de Cristo; Primeiras comunidades cristãs do Novo Testamento; Igreja sacramento; níveis e modelos eclesisais; discipulado e missão para que todos tenham vida.

 

(Sobre Movimentos e a Igreja local; grupos de jovens; áreas pastorais, ver o Apêndice ‘Comunidade-Grupos')

 

  1. Setorização

El sectorizar territorialmente es un paso válido y el proceso de las Cebs lo exigen. Sin embargo, esa descentralización estructural, no va a llevar siempre a la creación de CEBs. Estas no son una mera expresión menor de la estructura eclesiástica ya superada, sino el surgimiento, en semilla, de un nuevo modelo, con la eclesiología que lo fundamenta.

 

Setorizar territorialmente é um passo válido e o processo das CEBs o exigem. Sem dúvida essa descentralização estrutural,  nem sempre levará à criação de CEBs. Elas não são simplesmente  expressão menor da estrutura eclesial já superada, mas o surgimento, em semente, de um novo modelo, com a eclesiologia que o fundamenta.

 

Setorização sem mudança de visão, de prioridades e, portanto, de modelo, resultará em  miniparóquias tridentinas[1]. A proposta das CEBs, com efeito, diz respeito ao modo de ser e entender a vida e a missão eclesiais, após o Vaticano II. Não é uma pintura nova em uma casa sem mudanças. Tampouco é  uma casa nova que abriga uma família sem conversão. É gente nova que constrói uma casa adequada para viver o novo modo de ser ‘família'. Na proposta das CEBs, o ponto de partida não é a simples mudança da estrutura paroquial, mas do modo de ser comunidade; de marcar presença na vida; de ler a Palavra de Deus; de realizar o compromisso de transformação da realidade;, de entender e organizar o poder na comunidade;da relação com as demais instâncias eclesiais.

 

A setorização, portanto, é pensada na linha de confirmação do modelo eclesial que as CEBs devem expressar: Reino e Povo de Deus; Jesus histórico; protagonismo do Espírito; Igreja local; troca da estrutura paroquial (setorizada, comunidade de comunidades); CEBs célula básica; método; ecumenismo; cidadania; ecologia; opção pelos pobres (DAp 179); testemunho martirizado (DAp 178); através não de simples teorias, masde uma metodologia de participação e de experiência,como Jesus fez e ensinou.

 

Os documentos pastorais dos últimos anos insistem que a paróquia deve ser uma rede de comunidades nascidas e desenvolvidas conforme o modelo do Vaticano II e das Assembleias Gerais Latino-americanas e Caribenhas. As CEBs devem assumir a responsabilidade efetiva de ser a base comunitária da Igreja (Medellin 15,10). Isso significa que a proposta de paróquia - comunidade de comunidades - é entendida no contexto de criação de outro nível básico de Igreja. Deixa de ser base eclesial e assume o âmbito de articulação e/ou coordenação.[2]

 

O Documento de Aparecida volta a insistir na "setorização paroquial em unidades territoriais menores, com equipes próprias de animação e coordenação..."(DAp 372). No número 513, ao tratar da situação urbana moderna, o DAp menciona a setorização, sem reduzi-la a simples território (porém não explica isto melhor).

 

 

  • 4.1 Passos para a setorização:

 

  • motivação geral de todos os batizados sobre o conteúdo e o método de setorização;

 

  • definir um espaço humano territorial ou funcional a ser assumido por uma equipe de animação e coordenação (Equipe Motora - EM), como nível eclesial de base;

 

  • identificar com quem se pode contar para formar a referida Equipe Motora, por exemplo, pessoas oriundas dos movimentos ou de outras experiências pastorais. Convocar e preparar a EM, para que seja colegiada e assim atue.Solucionar problemas logísticos e operativos, por exemplo, onde se reunir? (cf. Apêndice sobre a Igreja da casa); qual a frequência dos encontros específicos etc.;

  • o conselho paroquial ou uma equipe constituída para isso, acompanha, coordena, assessora o apoio dos serviços paroquiais - como catequese, liturgia, pastoral social, animação bíblica, etc. - às CEBs que vão surgindo nos setores;

  • realizam-se assembleias paroquiais das CEBs, semestralmente ou com mais frequência, conforme a necessidade, Há casos em que as coordenações dos setores participam, automaticamente, do conselho paroquial. Em outros casos, organiza-se um conselho pastoral específico de CEBs, que atua em íntima sintonia com o conselho paroquial de pastoral;

  • os grupos de jovens, de medicina alternativa, de cidadania, de ecologia etc. reúnem membros de diferentes setores e atuam, como grupo, mais em âmbito paroquial. Como indivíduos, devem estar inseridos em uma CEB;

  • as CEBs de um setor apoiam as iniciativas já existentes, quer em relação à ecologia, à cidadania, à transformação libertadora das estruturas etc. Essas CEBs atuam como parte de uma rede de comunidades com metas, método e estratégias comuns.

 

 

4.2 A Equipe Motora

 

  • Visita às famílias da área (principalmente aos batizados). Cada dupla (casal?) será responsável por visitar um pequeno número de famílias do setor (não mais de 5). Realizará várias visitas durante o ano, seja em eventos litúrgicos especiais (Quarta-feira de Cinzas, Domingo de Ramos, Natal...); seja em datas do calendário civil (Dia das Mães...); seja em eventos da vida (doenças, funerais, novas famílias, partida de jovens para trabalhar ou estudar em outras cidades etc.).

 

  • As visitas às famílias são ‘como na Bíblia' e não tanto ‘com a Bíblia' (diferente dos visitadores pentecostais que não vêm para dialogar, mas para impor uma conversão instantânea e proselitista). A visita não é uma etapa do processo, mas o modo comum de a Igreja relacionar-se com seu entorno.

 

  • A espiritualidade vivida é a da mística da comunidade como Igreja local (não se trata da espiritualidade específica de um movimento ou programa); Jesus e seu projeto, pouco a pouco, tornam-se centro da vida. A leitura orante de Palavra de Deus ajuda; as devoções populares e seus símbolos são respeitados, assumidos e redimensionados a partir de Jesus.

 

  • É necessária uma preparação específica sobre a forma de visitar as casas (não para discursar, pedir dinheiro, convidar para eventos religiosos na paróquia ou no setor, discutir sobre religião, defender o clero quando esse é atacado...). É preciso um mínimo de preparação bíblica, cristológica, eclesiológica, social e de técnicas de diálogo e visita. Respeita-se o ritmo das pessoas (símbolos e referências culturais, tradições, história). A visita é para ‘estar com', escutar, valorizar as pessoas e, ocasionalmente, compartilhar explicações ou responder a breves perguntas, cuidando de não tratar sobre teorias, mas sobre experiências. A relação de amizade pessoal continua fora da casa, em outros encontros ocasionais com a família visitada, na rua, no mercado etc. Durante o ano, algumas celebrações  ou encontros de diversas famílias... sem criar, de imediato, a obrigação sistemática de assiti-las.

 

Em resumo, a Equipe Motora:

 

  • a) assume os batizados de uma área, estabelecendo contatos frequentes, que lhes assegura a pertença à Igreja católica;

 

b) descentraliza da paróquia a vida sacramental e devocional, fazendo, no setor, a preparação e, pouco a pouco, a celebração do Batismo, da Primeira Eucaristia,  dos funerais etc.;

 

 

 

c) não se deve esperar que tudo esteja definido e esclarecido para poder realizar o trabalho no setor. A grande maioria dos novos passos pastorais que foram dados na história da Igreja "não estavam permitidos... muito menos proibidos!"

 

Há, pois, uma novidade em relação à estruturação da CEB. Ela vai ser constituída:

 

a) por Equipes Motoras que se reúnem com maior frequência (semanal?), dedicando-se a acompanhar os batizados de seu setor;

b) pelos demais batizados que se sentem em comunhão com as referidas equipes.

 

 

Por isso, na mesma CEB, vão coexistir, intimamente unidos, dois níveis de intensidade participativa: o das mencionadas Equipes Motoras e o das pessoas que continuam se considerando católicas, porém cuja presença é ocasional. Em consequência, o número de membros de uma CEB vai aumentar, uma vez que já não se restringe aos 7 ou 8 da Equipe Motora.

 

 

4.3 A relação com o ministro ordenado

 

  • Não é possível a onipresença do pároco. Na organização pastoral hoje existente, é impossível pensar em um presbítero para cada CEB. Eles vão agir de maneira semelhante aos ‘Cor-epíscopos' dos primeiros séculos, presidindo (visitando) ‘estações missionárias', paróquias sub-Urbicarias; comunidades ‘perdidas' nas distâncias rurais, reunindo, ocasionalmente, várias CEBs para alguma atividade de formação ou para uma Celebração Eucarística geral.

 

  • A multiplicação de Missas pelas casas pode não ser o mais indicado, pelo risco de reduzir a Eucaristia a um simples instrumento para reunir as pessoas, ou de transformá-la em uma espécie de costume devocional junto com a tradição santoral do catolicismo popular. A questão, no entanto, não está fechada, porque cada comunidade eclesial tem natureza Eucarística (direitodivino). A falta numérica de ministros ordenados é um problema  disciplinas

 

  • O pastor, quando se encontra com as pessoas, deve fazê-lo em sintonia com a equipe de animação e coordenação e não se restringir unicamente aos atos e costumes devocionais que somente ele pode exercer. É importante que se multipliquem encontros personalizados das comunidades com seus pastores, compartilhando orações e convivência informal. O pastor não é um simples funcionário de uma instituição religiosa, mas aquele que preside a comunidade, seja diretamente, seja através de equipes por ele  delegadas ou confirmadas.

 

  • É urgente a recuperação do presbítero como instância presidencial das comunidades, em união com o bispo diocesano; como experiência de fraternidade evangélica entre os ministros ordenados (ajuda mútua; estudo; apoio, nas diversas expressões da vida; crescimento espiritual [aggiornamento]).

 

  • No contexto urbano, é preciso revisar a multiplicação de paróquias em uma mesma cidade, para que,face à moderna característica urbana, a Igreja não se apresente como uma pluralidade desarticulada de sua organização de base.

 

 

  1. Delegar

 

 

Na medida em que as CEBs desenvolvem-se, amadurecem, elas vão assumindo responsabilidades como preparação para a Primeira Eucaristia; catecumenato; ministério extraordinário da Sagrada Comunhão e do Batismo; bênçãos várias, como nos funerais; acompanhamento das famílias atingidas pelo luto; ser testemunhas qualificadas da Igreja na celebração dos casamentos ou em  algum encontro ecumênico; relacionamento com as equipes de ação social de sua área, que trabalhem pelos direitos humanos, pela ecologia etc.

 

 

Tudo isto deve ser constantemente avaliado e, em determinados casos, complementado pela instância paroquial ou diocesana.

 

 

6 Lições Estratégicas

 

  • Comparações: a) a serpente: sua nova pele é preparada embaixo da nova. Quando está pronta a nova, a outra cai. Tirá-la antes mata o ser vivo;  b) as microdoses: as CEBs são como microdoses do novo modelo eclesial. Um provérbio africano ensina: "Pessoas pequenas, em lugares pequenos, fazendo pequenas coisas, provocam grandes transformações!"

 

  • As comunidades aprendem a viver com o mínimo de estrutura e o máximo de vida.Quando há muita estrutura, pode haver pouca vida.

 

  • Toda hora é hora de Deus e por isso mesmo, boa hora para começar o que é obra d'Ele.

 

  • Se trabalha com o que se tem, não com o que se quisera ter.

 

  • É necessário atuar em comunidade, em equipe, porque Jesus prometeu estar com aqueles que se reúnem em seu nome (Mt 18,20).

 

  • O próprio Jesus é a Boa Nova e não as ameaças de vingança divina.

 

  • As comunidades cristãs não são homogêneas nem uniformes... Conhecem o pluralismo dos modelos, permanecendo fiéis aos elementos da Revelação e das propostas das Conferências do Episcopado Latino-americano e Caribenho, que continuam válidas no momento histórico que ora vivemos. As primeiras comunidades cristãs não conheceram um cristianismo massivo nem devocional.

 

  • A conversão a Jesus e o Batismo significam necessariamente também a pertença a  uma comunidade.

 

  • Na comunidade, os ministérios vão surgindo conforme a necessidade. O Espírito não deixará de enviar vocações à Igreja, o importante é identificá-las e delas cuidar.


 


[1] A paróquia foi, até agora, e para muitos segue sendo, a única base eclesial canônica dos batizados. No entanto, é isso precisamente que hoje está sendo revisado. Ela não pode, estruturalmente, alcançar a maioria dos batizados; está organizada segundo um modelo de ‘cristandade', fortemente clerical e centralizador. Sua linguagem, suas prioridades, suas pessoas estão muito distanciadas da realidade contemporânea e, além disso, concentram-se, quase unicamente, no devocional, assistencial, administrativo, catequético mínimo e litúrgico.

[2]Desse modo a  paróquia - rede de comunidades - não é, portanto, uma estratégia para multiplicar células eclesiais, mas muito mais, um esforço colegiado de expressar uma Igreja samaritana, toda ela comunidade missionária e missão comunitária, que forma na vida, para a vida. A ajuda das pastorais especializadas, aarticulação com o conselho pastoral visam ajudar as igrejas de base a viver o novo modelo eclesial do Vaticano II.