O ambiente medieval do Século XI ao XIII foi mais ou menos favorável ao papado. Contudo o fim do século XIII conheceu acontecimentos inéditos enquanto o século seguinte, o XIV foi marcado por lutas político-religiosas. Vejamos agora o papado a partir do final do século XIII.

Após a morte do Papa Nicolau IV ( 1288 - 1292 ) a sede papal ficou vacante por dois anos porque os cardeais estavam divididos quanto a escolha do novo papa e o Rei Carlos II de Nápoles procurava influenciar na escolha. Finalmente, os cardeais resolveram escolher um papa apolítico, livre da influência dos governantes da época, que se ocupasse estritamente da santificação do povo de Deus. Escolheram um eremita chamado Pedro de Monte Morrone. Este monge tomou o nome de Celestino V. Como era uma pessoa de um grande coração, a sua bondade simplória o tornou inepto para a função pois nomeou cardeais subordinados aos interesses franceses e cometeu o absurdo de atender ao convite do Rei Carlos II, de Nápoles, para transferir sua residência para esta cidade. depois reconheceu-se incapaz para ocupar o trono pontifício e renunciou espontaneamente. Fora eleito em julho e deixava o cargo em dezembro daquele ano de 1294. Sua renúncia, foi aplaudida por muitos e censurada por outros. Assim Celestino V entrou para a História da Igreja como um simplório homem que ocupara a cátedra de São Pedro por seis meses apenas.

Após as renúncia de Celestino V, os cardeais se reuniram e num só dia elegeram seu sucessor, Bonifácio VIII. Este ao assumir ficou temeroso que pudesse ocorrer um cisma na Igreja por parte dos partidários de Celestino V e resolveu mantê-lo retirado num mosteiro até sua morte em 1296. Mais tarde, a Igreja viria canonizar o bondoso, simplório e puro de coração, Celestino V, como santo da Igreja.

Bonifácio VIII era um homem culto, piedoso, de grande força de vontade, mas impetuoso nas suas decisões e ações, enérgico e de elevados ideais. Quis pôr em prática as idéias de Gregório VII e Inocêncio III, mas não percebia que os tempos agora eram outros e os reis, naquela virada de século, começavam a cultivar um nacionalismo absoluto que não havia ainda nos séculos XI, XII e XIII. Também teve de enfrentar dificuldades dentro da própria Igreja, pois fora eleito por causa da renúncia de Celestino V e subiu à cátedra de São Pedro com o ex-papa ainda vivo. Porém Celestino tinha todo o direito de renunciar o que fez com que a eleição de Bonifácio VIII fosse perfeitamente válida.

A última Cruzada contra os muçulmanos comandada por São Luis IX da França já fazia algum tempo que fora realizada e Bonifácio VIII tencionava restaurar a prática das mesmas. Para isso precisava que os reis do Ocidente se unissem. Porém isso era impossível, pois Felipe , o Belo, Rei da França, estava em luta contra o Rei Eduardo I da Inglaterra por causa de ambições territoriais. Naquele tempo era permitido aos reis cobrarem impostos dos clérigos para as despesas de guerra. Isso infringia as prescrições e, por isso Bonifácio VIII resolveu coibir esse abuso dos reis através da Bula Clericis Laicos de 1296 pela qual proibia e ameaçava de excomunhão os clérigos que pagassem impostos a leigos ainda que fossem imperadores e reis. Eduardo I da Inglaterra depois de muita indignação se submeteu à determinação do pontífice, mas Felipe, o Belo, da França, reagiu e proibiu a exportação de ouro, prata , armas , cavalos e tudo o mais que o papa tinha pedido para a Cruzada que ansiava organizar e ainda decretou a expulsão do território francês de todos os estrangeiros, medida que visava atingir os legados papais. Diante de tal situação o papa procurou contemporizar e entrou em entendimento com Felipe, o Belo, e as coisas foram amainadas. Bonifácio VIII queria acima de tudo evitar atritos e manter a cristandade unida.

No dia 22 de fevereiro do ano de 1300, o Papa Bonifácio VIII proclama o primeiro Ano Santo na História da Igreja e concede indulgência plenária a todo peregrino que visitar a cidade de Roma: 30 dias para quem for romano e 15 dias para quem fosse estrangeiro. O ano 1300 torna-se um ano jubilar e de todos os cantos os peregrinos se dirigem para Roma, entre eles pessoas famosas como os representantes das artes da época: Oderisi de Gúbio, o miniaturista, João Villani, escritor famoso, Giotto, mestre da pintura e Dante Alighieri, prior do Convento de Florença e que seria poeta máximo de todos os tempos , autor de "A Divina Comédia".

Novamente o Rei Felipe IV, o Belo, entrou em atrito com Bonifácio VIII. Em 1301, o Bispo Bernardo de Saisset compareceu à presença de Felipe, representando o papa, cobrou dele a cruzada planejada e o censurou por abusos e violação dos direitos da Igreja. Resultado: o legado foi preso por ordem do audacioso Felipe. Bonifácio VIII protestou e exigiu a libertação do Bispo Bernardo e renovou a proibição de impostos ao clero. O rei insuflou o povo contra o papa e queimou uma bula papal de advertência a ele. Em abril de 1302, reuniu-se em Paris uma grande assembléia onde compareceram a nobreza, o clero e a burguesia. Todos apoiaram o rei que proibiu os prelados de comparecerem ao Sínodo de Roma convocado pelo papa. Mesmo assim 40 prelados franceses desafiaram Felipe, o Belo, e compareceram ao Sínodo que se realizou em 30 de setembro de 1302. As disposições do rei foram votadas e rejeitadas. O Sínodo defendeu o direito do papa sobre os reis cristãos.

Felipe, o Belo reagiu com irritação e passou a trabalhar para depor o papa acusando-o de herege, simoníaco, fornicador, etc... Bonifácio VIII jurava, de sua parte, que tais acusações eram falsas. Em 08 de setembro de 1303, o papa decidiu lançar a excomunhão no rei da França. Mas o Chanceler francês Guilherme de Nogaret, ajudado por alguns nobres romanos descontentes com o papa, assaltaram a residência pontifícia, prenderam Bonifácio VIII e o espancaram. Depois ameaçaram levá-lo a julgamento em um concílio, caso não renunciasse. Mas Bonifácio VIII manteve-se firme. Seus concidadãos conseguiram libertá-lo e o reconduziram a Roma. Sua saúde não resistiu a tanta humilhação e emoções e o pontífice faleceu dias depois, em 12 de outubro de 1303.

Bonifácio VIII foi um grande pontífice. Seu grande erro foi querer levar adiante o ideal de seus antecessores, sem se dar conta que os tempos haviam mudado. Os reis e nobres ditos "católicos "de seu tempo não eram como os monarcas e nobres dos séculos anteriores. Além disso, a Idade Média começava a marchar para o seu final e o pensamento da época evoluía. Seu insucesso marcava o enfraquecimento da autoridade papal no foro político e a rejeição da tese do poder universal do Romano Pontífice.