Voz de Jesus Cristo: "Filho, em qualquer lugar que estejas, qualquer coisa que faças, em qualquer ocupação que te aches, cuida muito em viver sempre livre no interior e ser senhor de ti, de sorte que tudo te esteja sujeito e tu não estejas à coisa alguma. Conserva sobre tuas ações um império absoluto; sê senhor delas e não escravo seu. Como um verdadeiro israelita liberto de toda a escravidão, entra na herança e na liberdade dos filhos de Deus, os quais, elevados acima das coisas presentes, contemplam as da eternidade. Se por um instante, lançam os olhos ao que é transitório, nunca os apartam do que há de durar para sempre; superiores aos bens do tempo, não se deixam levar pelo seu atrativo, antes os forçam à servir ao bem verdadeiro, segundo a ordem estabelecida por Deus, regulador supremo, que nada deixou desordenado em suas obras. Se, em qualquer acontecimento, não te fundares na aparência exterior e não considerares só com os olhos da carne o que vires e ouvires; se entrares primeiro, como Moisés no tabernáculo, para consultar o Senhor, ouvirás algumas vezes o seu divino oráculo e voltarás instruído de muitas coisas presentes e futuras. Pois sempre recorreu Moisés ao tabernáculo, para aclarar as dúvidas e resolver as dificuldades, e tomou o auxílio da oração para livrar-se dos perigos e maldades dos homens. Assim deves tu retirar-te ao secreto de teu coração, para implorar com mais eficácia o auxílio de Deus. Por isso lemos que Josué e os filhos de Israel foram enganados pelos gabaonitas, "por que não tinham antes consultado o Senhor e, demasiadamente crédulos a suas lisonjeiras palavras, se deixaram enganar por uma falsa compaixão".

Da "Imitação de Cristo"

Livro III - capítulo xxxviii

Título: "Como nos havemos de governar nas coisas exteriores e recorrer à Deus nos perigos"

Thomas de kempis

Agostiniano


Da consideração de si mesmo:

1- "Não devemos confiar demasiado em nós mesmos, porque muitas vezes nos faltam a graça e o discernimento. Pouca luz há em nós, e esse pouco perdemo-lo depressa, por nosso descuido. Muitas vezes não conhecemos quão cegos estamos na alma. Muitas vezes também agimos mal, e ainda pior, nos desculpamos. Às vezes somos levados pela paixão, e julgamos que é o zelo. Repreendemos nos outros as faltas pequenas e desculpamos as nossas, mesmo as mais graves. Mui depressa sentimos e nos magoamos com o que sofremos dos outros; mas não pensamos muito no quanto os outros sofrem por causa de nós. O que bem e retamente examinar suas ações, não terá que julgar severamente as alheias.

2- O homem de vida interior antepõe o cuidado de si mesmo a todos os outros cuidados; e com diligência atende a si; com facilidade se abstém de falar dos outros. Nunca serás homem de vida interior e devoto, se não calares dos outros e tiveres especial cuidado de ti. Se te ocupares totalmente com Deus e contigo, pouco te abalará o que vires à tua volta. Onde estás quando não estás contigo? De que te aproveitou lembrares-te de tudo, se de ti te esqueceste? Se queres ter paz e união verdadeira com Deus, deves desprezar tudo o mais, para cuidares de ti só. Adiantarás, portanto, muito, se te conservares livre de toda a preocupação temporal; mas muito atrasarás, se tiveres em estima alguma coisa temporal. Nada te pareça grande, elevado, agradável ou digno de aceitação, a não ser somente Deus ou o que a ele se refere. Tem por vã qualquer consolação que te vier da criatura. A alma que deveras ama a Deus, despreza tudo o que não é de Deus. Só Deus, eterno, imenso e que tudo enche, é a consolação da alma, e a verdadeira alegria do coração."

 

A imitação de cristo

Livro 2 - capítulo 5

Tomas de kempis

Clerigo agostiniano