O movimento reformador chegou a Inglaterra  em condições singulares. O cristianismo britânico sempre teve suas características próprias, em parte por causa da sua posição geográfica,  pois como sabemos, a Inglaterra é uma ilha. Por isso a tendência a formar uma Igreja nacional  acentuou-se através dos séculos. .John Wicleff no século XIV e os humanistas do século XV e XVI  prepararam a via aberta para a revolução  religiosa. Esta se deu realmente no século XVI : a principio tinha apenas o aspecto de um  cisma sem heresia (cisma devido a ambição pessoal de um rei, sem que o povo participasse  da revolta). Somente aos poucos é que as idéias protestantes foram entrando na comunidade britânica.

Vejamos agora como foi que tudo aconteceu:

Nos primeiros tempos do luteranismo, o rei da Inglaterra Henrique VIII mostrou-se zeloso para com a fé católica. Procurou proteger a Igreja na Inglaterra e em 1521  escreveu contra a obra de Lutero em "O Cavaleiro Babilônico"  e também uma  afirmação dos Sete Sacramentos ". Isso lhe valeu do Papa Leão X  o título de "Defensor da Fé "para ele e sua descendência. Não obstante, este rei haveria de ser arrastado por seus afetos  e pouco depois se voltaria contra a Igreja que demonstrou defender

Em l509 Henrique havia se casado com Catarina de Aragão viúva de seu irmão Artur. Este casamento pode ser realizado mediante a explícita licença do papa Júlio III.Com ela ele teve vários filhos dos quais apenas Maria Tudor  ficou em vida. Ora, aconteceu que depois de dezoito anos de convivência com Catarina de Aragão, Henrique VIII resolveu  se separar de Catarina para se casar novamente com Ana  Bolena  por  ele  estava  apaixonado. Ele  alegava   que o seu  casamento com Catarina era nulo pois eles eram cunhados. Tal pretexto era falso porque ele havia recebido o consentimento explícito do  Papa Júlio III. Somente  agora, depois de dezoitos anos de convivência conjugal com Catarina de Aragão  é que Henrique VIII trazia à tona esse "impedimento ". A corte real inglesa se colocou ao lado do rei favorecendo um novo casamento, dessa vez com Ana Bolena. Lesada em seus direitos, a Rainha Catarina de Aragão apelava para a Santa Sé pedindo justiça. O Papa Clemente VII resolveu entregar o exame do processo a um tribunal de Roma em julho de l529.

Em janeiro de 1531 o papa proibiu a Henrique de contrair novas núpcias enquanto a causa estivesse em julgamento. O Rei Henrique VIII vendo que teria poucas esperanças, quis obter a solução de seu casamento resolvendo-o com a hierarquia da Inglaterra. Thomas Cromwel ,obscuro advogado que adquirira influência sobre o rei, aconselhava-o a seguir os passos dos príncipes alemães e separar-se de Roma. Em fevereiro de 1531, a Assembléia do Clero instigada e pressionada pelo rei, proclamou Henrique como "Chefe Supremo da Igreja na Inglaterra " com uma cláusula que dizia: "  na medida em que a Lei de Cristo o permite ".No ano seguinte, 1532,Henrique VIII elevou à sede arquiepiscopal de Cantuária  Thomas Cranmer, que numa viagem à Alemanha havia entrado em contato com o Luteranismo. Uma vez elevado ao cargo de Arcebispo da Cantuária, Thomas Cranmer resolveu declarar nulo o casamento de Henrique VIII com Catarina de Aragão.

Dessa forma  Henrique se declarou livre para se casar novamente e o fez, em 1533,  unindo-se irregularmente a Ana Bolena. O papa respondeu  com energia excomungando a Henrique VIII por causa do seu abuso, declarando válido o seu casamento anterior com Catarina de Aragão. A situação ficou tensa e o cisma estava às portas.

Em novembro de 1534, o parlamento inglês votou o "Ato de Supremacia Régia" que proclamava Henrique VIII como Único e Supremo Chefe da Igreja na Inglaterra. Todos os súditos ingleses que não reconhecessem este Ato, seriam punidos com a morte. Dessa forma  a Igreja da Inglaterra separava-se de Roma  e ficava diretamente subordinada ao rei. A grande maioria do clero submeteu-se talvez acostumados com o conceito de uma Igreja nacional. Contudo alguns  leigos e clérigos resistiram até a morte, entre eles  São João Fischer, bispo de Rocheester, e São Thomás  Moore, Primeiro-Ministro de Henrique VIII. Ambos foram aprisionados em Londres e decapitados em 1535. A perseguição religiosa foi violenta: mosteiros foram fechados, relíquias e imagens foram destruídas  e os que não queriam aceitar o Ato de Supremacia Régia eram executados. Henrique VIII combatia tanto a adesão ao papa quanto as inovações religiosas no continente. Este estado de coisas permaneceu até a sua morte em  1547.

Em 1547, sucedeu-o no trono seu filho menor Eduardo VI de apenas dez anos de idade. Este era filho já do seu terceiro matrimônio, já que Henrique se descasara e casara-se  mais vezes. Este menino, Eduardo VI, teve como tutores o duque de  Somerset e o duque de Northumberland. Estes juntamente com o Arcebispo Cranmer, de Cantuária, muito trabalharam pela introdução da teologia protestante na Inglaterra. Cranmer proclamou o menino como rei por direito divino imediato, com plenos poderes no plano espiritual e temporal. Foram chamados  do continente teólogos protestantes como Bernardino Ochino ( um capuchinho que havia apostatado em 1542), Martinho Bucer  e  John Laski. O próprio João Calvino deus instruções escritas para se efetuar a protestantização da Inglaterra. O novos mentores elaboraram um livro chamado "Livro Comum de Oração " que introduzia a nova liturgia em inglês, transformava a missa abolindo o seu caráter sacrificial, prescrevia a comunhão sob as duas espécies, contudo procurava guardar muitos elementos do missal e do ritual católicos. Em 1553 foi promulgada  uma Confissão de Fé com 42 artigos que seguia principalmente a Calvino no tocante a predestinação e a Eucaristia. A hierarquia não foi abolida e por isso a Igreja Anglicana também ficoui conhecuida depiois como "Episcopal ". Depois de Henrique VIII, seu filho Eduardo VI também tornara-se chefe da Igreja Anglicana e como se viu esta contou com sua proteção durante seu  breve reinado. O jovem rei Eduardo VI  teve um reinado de curta duração: morreu em 1553 com  apenas 16 anos de idade. Depois dele as coisas mudariam na Inglaterra.

Com a morte de Eduardo VI, em 1553, sobe ao trono a sua irmã mais velha Maria Tudor, filha do casamento de Henrique VIII com Catarina de Aragão, sua primeira esposa. Maria era católica devota e recusou o título de Chefe da Igreja Anglicana. Ao contrário procurou restabelecer o catolicismo em toda a Inglaterra contando para isso com a ajuda de seu primo, o Cardeal Reginaldo Pole, legado papal. Sob seu reinado, em 1554  o parlamento inglês votou uma nova união com a Santa Sé. Todos os prelados depostos por seu irmão Eduardo VI foram restabelecidos em suas sedes e a Igreja Católica ficava restabelecida em toda a Inglaterra. Maria agiu com energia contra os hereges protestantes  que haviam vindo do estrangeiro e expulsou-os da Inglaterra. Em seu zelo restaurador, Maria adotou medidas extremas contra os protestantes, semelhantes às que seu pai, Henrique VIII  adotara  antes  contra  os  católicos. Isso  provocou  uma  reação contra ela em toda a Inglaterra. Os protestantes reagiram e Maria tomou providências enérgicas. Em sua repressão, 280 dissidentes foram condenados à morte, entre eles  Thomas Cranmer tornado irregularmente arcebispo da Cantuária e que tanto ajudou a introduzir  as idéias reformadoras na Inglaterra. Os próprios católicos foram contrários às medidas violentas por ela tomadas. A Igreja jamais apoiou essa ação repressiva dela  uma vez que destoava dos princípios cristãos da tolerância e da caridade.

Maria Tudor morreu em 1558 depois de haver reinado durante cinco anos. Ficou conhecida como "Maria, a Sanguinária ". Depois de sua morte a  restauração do catolicismo em toda a Inglaterra, aprovado em l554, foi extinguido.

Depois de Maria Tudor a Igreja Anglicana haveria de ganhar um grande impulso no reinado de sua irmã e sucessora, Elizabeth I, que subiu ao trono inglês  em 1558.Esta era filha de Henrique VIII com Ana Bolena e chegou trono porque Maria não deixara herdeiros. Elizabeth  I elevou a Inglaterra a um extraordinário poderio político e econômico. Sob seu reinado a Inglaterra transformou-se em grande potência  naval e comercial. A sua religiosidade era misteriosa: convertera-se ao catolicismo durante o reinado de Maria Tudor e no dia da sua coroação prometera manter o catolicismo em vigor no país. Depois continuou a freqüentar as missas, a confessar-se e a comungar. Contudo essas atitudes não eram profundas em sua alma e pouco depois, por razões de interesse políticos, Elizabeth  violou a sua palavra e a fé que demonstrava professar. Como os católicos não a consideravam a rainha legítima  pois consideravam  que Maria Stuart, da Escócia, como a que deveria ocupar o trono da Inglaterra. Isso fez com que Elizabeth se inclinasse para o lado do protestantismo. Em conseqüência disso, sob as aparências de católica foi tomando medidas anticatólicas e antipapais. Libertou todos os teólogos presos  durante o reinado de Maria e chamou de volta os pregadores reformistas expulsos da Inglaterra anteriormente por Maria como hereges. Elizabeth I reorganizou a Igreja Anglicana, protegeu-a e a fez crescer. Quando Elizabeth I morreu em 1603 a Igreja Anglicana estava forte e consolidada.

Depois de Elizabeth  I  apenas um breve incidente ocorreu no final do século XVII durante o curto reinado de Jaime II. Este monarca que subira ao trono em 1585 professava a fé católica e, assim como Maria Tudor,  não quis receber o titulo de Chefe da Igreja Anglicana. Em 1588 ele determinou que todos os seus súditos deveriam confessar-se e comungar  na Igreja Católica pelo menos uma vez por ano na Páscoa conforme manda a Igreja. Essa medida atingia a todos os protestantes ingleses que se revoltaram contra ele. A reação foi tão intensa que Jaime II teve de fugir da Inglaterra e refugiar-se na França. Foi a chamada "Revolução Gloriosa" porque foi feita sem derramamento de sangue. O parlamento inglês respaldado pelo apoio popular entregou o trono a Guilherme de Orange e sua mulher Maria que se tornaram reis da Inglaterra. O  parlamento aprovou ainda uma lei  determinando que a partir de então todos os reis da Inglaterra  deveriam professar a fé Anglicana. E assim foi a partir de então. Atualmente a Rainha Elizabeth II ocupa o trono da  Grã-Bretanha  e é a Chefe da Igreja Anglicana.

As leis repressivas e anticatólicas dos tempos de Elizabeth I foram abrandadas nos últimos dois séculos. Contudo conservaram seu rigor  no Ulster que equivale a  20 por cento do território da Irlanda. Em 1921,  80 por cento da ilha tornou-se independente da Inglaterra formando a República da Irlanda predominantemente católica. A outra parte constitui-se na Irlanda do Norte de maioria protestante onde a minoria católica ainda sofre algumas restrições devido à legislaçào discriminatória vigente. Os católicos querem  uma união com a República do Eire ( nome da Irlanda do Sul ). Os protestantes naturalmente se opõem . Isso explica os constantes choques entre católicos e protestantes que sempre ocorreram  na Irlanda do Norte