A Fé em Jesus normalmente engendra uma esperança ativa de dimensão cósmica em vista de uma plenitude que é perpétuo jorrar de novidade. Relativamente às verdadeiras perspectivas da fé, como são estreitos os horizontes daquilo que é efetivamente vivido por tantos cristãos! Para só falarmos daqueles que procuram "viver" da fé recebida no batismo, quantos encontram nela a fonte de uma dinamismo capaz de unificar sua vida, colocando-a a serviço da salvação de todos os homens? A maioria dos cristãos não tem consciência da grandeza de sua vocação; sua religião é mesquinha, individualista. Contentamo-nos com uma religiosidade mais ou menos autêntica, mas permanecemos estranhos às pulsações do Espírito cujo campo de ação é todo o universo. Sem dúvida, todos sabem que, no coração do cristianismo, há um mandamento novo do amor fraterno e universal; mas muitos são importantes quando se trata de reconhecer os domínios e as modalidades de aplicação desse preceito capaz de renovar a face da terra!

 

O momento histórico que hoje atravessamos convida o cristão, em principal o pobre, a avaliar as dimensões do universo no qual ele introduz a fé em Jesus Cristo. Para ele, esta é uma exigência essencial, se quer desempenhar no mundo atual o papel que lhe cabe. Não vivemos a fé de uma maneira qualquer. A fé responde a exigências objetivas que é preciso respeitar. E, quando o cristão não tem a fé que corresponde à situação histórica em que se encontra, não leva aos homens o testemunho que estes tem de esperar dele, e a própria fé se degrada. Não é mais o sal da terra.

6.1.  A ESPERA DA PLENITUDE ESCATOLÓGICA

Israel é um povo que vive, que ama a vida e que, do mais fundo de si mesmo, a deseja em plenitude para a alma e para o corpo. Exprime esta aspiração de todas as maneiras possíveis, mas uma das expressões que mais gosta de retomar evoca esta plenitude na congregação, no amor de Jahvé para com todos os membros do povo eleito disperso.

 

É bom notarmos que falar do povo de Israel é uma constante, porque é falar de um povo sofrido, de um pobre que não é desamparado e que por isso vive a sua esperança, ou seja, falar de Israel é falar do pobre de hoje, uma vez que os sofrimentos são bem parecidos e muito podemos aprender  do próprio contexto histórico, pois é a História a mãe dos ensinamentos e dos próprio erros humanos que muitas vezes se repetem na própria história.

 

Tendo acedido ao regime da Fé, Israel espera esta plenitude de vida de uma intervenção de seu Deus. Porque somente Jahvé é Senhor do destino de seu povo; somente ele está em condições de salvá-lo. Mas porque Jahvé é um Deus de amor, não pode salvar o homem sem sua colaboração. Por isso, concluiu uma aliança com seu povo: a salvação só pode provir do concurso de duas fidelidade.

 

Infelizmente, desde o deserto, Israel se mostra um povo recalcitrante, de cabeça dura. Peca e prefere o caminho das seguranças  à aventura espiritual que lhe propõe Jahvé. E este pecado do deserto renovar-se-á no decorrer das épocas, perpetuando a falta original do primeiro paraíso.

 

Profetas se insurgem para estigmatizar as infidelidades  do povo à Aliança, mas ao mesmo tempo para lembrar a fidelidade de Jahvé e seu apelo à conversão. Progressivamente, desencadeia-se em Israel uma busca apaixonada, conduzida pelos melhores: qual será o homem que dará a Deus uma resposta que lhe seja agradável? Quando vier o Messias, Jahvé conferirá ao seu povo a plenitude prometida. A esperança messiânica jorra de todos os lados; dá testemunho, em sua totalidade, do itinerário espiritual de Israel, e ocupa um lugar tão importante que podemos defini-la como "a espinha dorsal do Antigo Testamento".

 

No dia de Jahvé, a salvação descerá como um raio. Será tamanha a plenitude conferida que nada mais haverá de comum entre o mundo presente e o novo paraíso: uma terra nova; novos céus, um coração novo que tornará o homem sensível à ação do Espírito...

 

 

6.2. A VINDA DO FILHO DO HOMEM

 

Em seu discurso escatológico, Jesus manifesta a significação de sua intervenção messiânica, baseando-se no vocábulo e nos temas da literatura apocalíptica de seu tempo.

 

A intervenção da histórica do Filho do homem inaugura os últimos tempos. O dia de Jahvé chegou. A plenitude é conferida. A obra do Messias é colocada sob o signo da ecumenicidade: ele deve congregar todos os homens "dos quatro ventos", pois todos são chamados a ser filhos do Pai. Jerusalém é condenada, pois traiu sua missão atribuindo-se um privilégio onde só havia uma responsabilidade a assumir; não renunciou ao seu particularismo.

 

O sinal do Filho do homem é seu itinerário de obediência até a morte da cruz. Devemos passar pela morte para entrar na vida eterna, porque a morte, afrontada na obediência, pode ser aqui na terra a realidade onde se consuma o máximo amor de Deus e de todos os homens. Não há maior amor que dar sua vida por aqueles que se ama.

 

Ao mesmo tempo, os dados da Escatologia antiga acham-se completamente transformados.  A plenitude esperada para os últimos tempos é conferida na terra como uma semente que só exige crescer. Intervindo na história, Jesus de Nazaré não traz uma plenitude pronta; ele a enraíza em seu princípio vivo. A plenitude escatológica vem do alto; mas antes de completar-se, deve desencadear-se todo um processo de crescimento, iniciado por Cristo e ao qual todos os homens são chamados, em Jesus Cristo, a dar a sua contribuição.

 

A congregação universal "dos quatros ventos", na qual consiste a plenitude esperada, é uma obra a ser realizada. A vinda do Filho do homem, em sua atualidade sempre presente, lembra-nos que só haverá um mestre de obras: Jesus Cristo. Seu sinal, sempre atual, lembra-nos de que as vias de crescimento para a plenitude  passam pela morte e pela cruz.

Desde a ressurreição de Cristo, a congregação de toda humanidade se efetua passo a passo, e o cosmo entra na face decisiva de seu crescimento em vista da recapitulação universal em Jesus Cristo. No cerne deste dinamismo, a Igreja desempenha o papel essencial, pois é o Corpo de Cristo. A Igreja está habilitada a desempenhar este papel, e ninguém pode desempenhá-lo em seu lugar. Contudo, ela o desempenha mais ou menos bem em função da felicidade de seus membros.

 

A busca da vontade de Deus leva o cristão a encarar com realismo todo o peso de morte que impregna o tecido da existência cotidiana individual e coletiva. É  preciso que ele a enfrente com "uma perfeita paciência e perseverança, dando alegremente graças ao Pai". O sinal do cristão não é outro senão o sinal do filho do homem: a obediência até a morte da cruz, amor de Deus e de todos os homens, a obediência que conduz à vida eterna passando pelo escândalo da morte.

 

Enfim, o Cristão deve saber que permanece pecador, que incessantemente deve clamar pelo Senhor das profundezas de sua miséria, que seu coração constantemente tem necessidade de converter-se a vontade do Pai.

 

Armada com esta fidelidade de seus membros, a Igreja poderá concretamente vencer a mais terrível tentação que nela se infiltra, a de identificar-se com a Jerusalém antiga, com o seu particularismo. Na medida em que realmente dá testemunho da vinda do Filho do homem, ela anuncia ao longo de sua própria história a destruição desta Jerusalém.

 

A vinda do Filho do homem fornece um impulso motriz a congregação do universo, mas o edifício desta congregação deve ser construído pedra por pedra pelas testemunhas  desta vinda. Tudo é realizado em Cristo; nele toda plenitude é conferida à humanidade. Mas tudo ainda deve ser realizado, e a plenitude da salvação está no termo de um crescimento. A missão é o ato eclesial que fornece a este crescimento o seu conteúdo essencial.

 

O obstáculo mais fundamental que se opõe à congregação do universo são as barreiras de separação que os povos e os espaços culturais não cessam de levantar entre si. Nisso, o pecado atua. O encontro com o outro em escala de povos e espaços culturais implica um reconhecimento do outro em todo o mistério de sua alteridade, o  que supõe o despojamento de si. Por ser pecador, o homem prefere estabelecer-se nas segurança de seu povo opor-se ao outro o destruído-lo, se preciso for. A missão pretende destruir este obstáculo à congregação do universo, sendo a expressão do máximo amor, o que compreendeu o amor dos inimigos. Ela quer manifestar que todos os homens, qualquer que seja sua diversidade, são de fato chamados a ser no único Reino os filhos de um mesmo Pai. Tudo isso só é possível se o cristão e também o pobre aceitar resolutamente a morte, a exemplo do Filho do homem, e entrar na obediência até a cruz.

 

Hoje em dia, tomamos consciência, melhor do que no passado, da extraordinária amplitude da tarefa missionária. Avaliamos melhor a estreita relação que liga, em sua distinção, a missão e o empreendimento de civilização. O problema número um que se coloca aos homens de nosso tempo chama-se o "encontro das culturas"; ele engaja, as mais diversas dimensões: política, social, econômica, etc.  É  neste mesmo terreno  que a missão da Igreja é Igreja é chamada a ser prioritariamente realizada.

6.3. A EUCARISTIA, PRELÚDIO DA CONGREGAÇÃO FINAL

Quando os cristãos se congregam para a Eucaristia, respondem a uma convocação universal, Qahal Yahweh, e a congregação na qual entram já apresenta as características da congregação final. Isto se dá porque os elos de fraternidade, nos quais a Eucaristia inicia, São exclusivamente definidos pela referência aquilo que foi realizado uma vez por todas em Jesus Cristo. Partilhando o Corpo de Cristo, o cristão recebe todos os homens como irmãos: é uma realidade que se torna atual para ele, pois já o é em plenitude em Cristo.

 

Dito isto, a Igreja deve cuidar para que suas congregações - a própria eclesiologia de comunhão se torne real e sempre presente -  que sejam organizadas de tal forma que signifiquem visivelmente o que elas contém.

 

Nestas condições, o germe de fraternidade universal realmente inserido no coração dos participantes poderá tomar corpo neles e repercutir nas profundezas de sua consciência.

 

Retornados à vida, estes homens e estas mulheres, que assim terão experimentado em sua carne algo da riqueza que representa a congregação universal do reino, assumirão a tarefa, através de todas as dificuldades que poderão apresentar-se em seu caminho, de realizar o que deve ser realizado para que todo o corpo cresça vez mais e atinja o mais rapidamente possível sua estatura definitiva.


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