O Humanismo ou Renascimento do século XVI foi afirmando os valores do homem em termos mais ou menos autônomos. No início do século XVI os sintomas de mentalidade leiga eram tantos que começaram a inquietar os ânimos tradicionais. Sem dúvida a ciência progredira muito no século XVI. Observações precisas apoiadas em novos métodos afastavam as conclusões da Filosofia e da Física medievais que eram formuladas de antemão sem muito contato com a realidade concreta. A chamada "vertigem da inteligência" foi tomando aos poucos os pensadores daquele século de tal forma que chegaram a  lançar um brado de "morte a Deus "O homem estava caminhando por si só. Até mesmo o frade Campanella ( 1568-1639 ) que abandonou momentaneamente sua profissão religiosa, dizia:

"Alguns cristãos descobriram a imprensa, Colombo descobriu o Novo Mundo, Galileu, novas estrelas... acrescentai a isso o uso dos canhões, da bússola, dos moinhos, das armas de fogo e todas essas invenções maravilhosas. Os pensadores de ontem eram crianças junto a nós. Nós somos livres!

Este frade mais tarde reassumiu a sua vida religiosa e morreu tranquilamente no convento de Saint Honoré, em Paris. Contudo suas afirmações nos dão uma idéia de como o Humanismo Renascentista influiu fortemente nas mentes dos pensadores do século XVI.  A humanidade que assim pensava ter atingido a idade adulta, julgava que para o futuro poderia dispensar a tutela de Deus.

Diante dessas novas correntes de pensamento as autoridades eclesiásticas reagiam com cautela. No caso flagrante de impiedade e ateísmo reagiam fortemente, desconfiando da nova ciência, movidas pelo desejo de preservar a verdade e os valores da cultura e da fé. Montaigne, por exemplo, submeteu todas as suas obras aos censores eclesiásticos. Estes, em resposta delicada lhe pediram que em consciência retocasse tudo o que pudesse retocar. Todas essas reações sintomáticas revelam o período de transição e incerteza acerca dos novos valores que estavam surgindo no cenário da civilização. E foi precisamente num ambiente de certa reação contra a fé, reação encabeçada por uma ciência aparente, que viveu Galileu Galilei, entre 1564 e 1642.

O sistema  geocêntrico de Ptolomeu (que faleceu por volta de 150  depois de Cristo) estivera em vigor durante toda a Idade Média. Em 1543 o Cônego Nicolau Copérnico publicou o livro "Sobre a revolução da órbita celeste" onde ele sugeria uma nova concepção: a de que a Terra e todos os demais planetas giravam em torno do Sol. A obra foi dedicada ao Papa Paulo III que a aceitou sem contradição Os doze pontífices seguintes não se mostraram contrários à obra de Nicolau Copérnico. Na verdade, por falta de provas seguras de que a Terra e os demais planetas conhecidos até então giravam mesmo em torno do Sol fez com que pouca credibilidade fosse dada à nova teoria. Foi justamente então que Galileu entrou em cena fazendo que a história mudasse totalmente de face.

A partir de 1610, Galileu abandonou o sistema ptolomaico e passou a aderir as idéias de Copérnico baseado em observações astronômicas recém realizadas. Foi por isso considerado um dos mais célebres e felizes astrônomos do seu tempo. Depois disso foi a Roma onde foi recebido pelo Papa Paulo V em audiência particular. Prelados e príncipes lhe felicitavam e pediram que lhes explicasse as maravilhas que havia descoberto. Era inevitável,porém, que entrasse no campo da Teologia.

Com efeito, havia quem desconfiasse das teses de Galileu e o quisesse impugnar em nome de textos bíblicos como o Salmo 103, Js 10,12-14 e Ecl 1,4-6.Galileu defendeu-se fazendo considerações escriturísticas. Numa carta ele chegou a afirmar: "A Sagrada Escritura não pode mentir e nem enganar. A veracidade das suas palavras é absoluta e inatacável. Aqueles, porém, que a explicam e a interpretam, é que podem se enganar de diversas maneiras... O Espírito Santo não quis ensinar-nos se o céu está em movimento ou se é imóvel. Se tem a forma de globo ou de disco. Se ele ou a terra se move ou se está em repouso. Já que o Espírito Santo não tencionou instruir-nos a respeito dessas coisas, é porque isso não importava a seus desígnios, que são a salvação das almas. Como se pretender agora que tal assunto, tal opinião, seja coisa de fé ou não ? Uma opinião que não diz respeito à salvação  das almas pode ser considerada herética ?"

Por mais sábia que fossem as considerações de Galileu, o Santo Ofício ( como era conhecida a Inquisição Romana), interveio no assunto. Uma comissão de teólogos depois de examinar as teses de heliocentrismo de Copérnico, deu parecer contrário às mesmas em 24 de fevereiro de 1616. Em conseqüência o Santo Ofício comunicou a Galileu a ordem de  "abandonar por inteiro a opinião que pretende  que o Sol é o centro do mundo, que é imóvel e que é a Terra que se move". Galileu estava ainda proibido pelo Santo Ofício de sustentar essa opinião como quer que fosse, a ensinasse ou a defendesse por palavras ou em escrito sob pena de ser processado pelo mesmo Santo Ofício.

Galileu Galilei aceitou docilmente a intimação do Santo Ofício. Em 5 de março a  Congregação do Índice condenou as obras de  Nicolau Copérnico até que fossem corrigidas. Contudo, o nome de Galileu não foi mencionado. O processo do Santo Ofício fora secreto de forma que o sábio Galileu  voltou a Florença prestigiado pela Santa Sé para continuar os seus estudos.

Muito estimulado pelos sucessos, Galileu Galilei voltou aos estudos e pôs-se a escrever nova obra em favor do heliocentrismo. Por causa disso foi novamente submetido à censura eclesiástica.Mesmo assim ele recebeu o "imprimatur"( permissão) sob a condição de que a tese do heliocentrismo não fosse colocada como certa mas como uma hipótese. Galileu, porém, não o fez dessa vez. Em 1632 ele publicou o livro exatamente como esta e fez mais ainda: colocou a aprovação recebida dos censores ( o Imprimatur). Este gesto causou uma grande agitação em Roma. Galileu perdia, dessa forma, a confiança das autoridades eclesiásticas.

Chamado novamente perante  o Santo Ofício, Galileu respondeu insistentemente que, em consciência, jamais admitira  como certo e definitivo o sistema de Copérnico.E como nada mais se podia apurar o processo contra Galileu foi encerrado pelo Santo Ofício em junho de 1633. Perante a Inquisição Romana, Galileu Galilei foi obrigado a abjurar publicamente o heliocentrismo e foi condenado a prisão branda juntamente com alguns amigos. Lá, mais uma vez ele continuou seus estudos. Morreu em Florença no dia 8 de janeiro de 1642, tendo recebido em seu leito de morte a bênção do Papa Urbano VIII. As descobertas da ciência aos poucos  fizeram ver aos teólogos que a Bíblia não quer ensinar conhecimentos profanos. Passaram então a distinguir e a aceitar aos poucos aquilo que no  contradizem mutuamente mas não interferem um no outro: o plano das ciências naturais e o plano da Bíblia e da Teologia.