2.1. A FESTA

A Festa é Constituída de Três Elementos:

a) Valorização de um acontecimento

Não é todo acontecimento que é digno de ser celebrado, festejado. Só merece festa um acontecimento importante. O povo sabe escolher. Pode ser um acontecimento passado que se celebra periodicamente ou um acontecimento recente festejado no momento do acontecimento. Por isso existem festas ocasionais e festas fixas, de calendário, que se repetem todo ano. Ano Novo. Dia do trabalhador, Natal, Aniversário..., cada país, cada região, cada povo tem suas festas fixas.

As festas ocasionais são imprevistas e imprevisíveis. Dependem dos acontecimentos felizes que exigem ser festejados.

Nos dois tipos de festas os que festejam dizem de sua alegria pelo que aconteceu. Não é todo acontecimento - mesmo positivo - que merece festa. O fato precisa ter causado certo impacto, ter sua importância.

 

b) A Expressão Significativa

É o modo, amaneira de mostrar como o acontecimento tem valor e qual seu significado. A alegria diante do que aconteceu quer expressar-se, extravasar e assim procura gesto que mostrem o posicionamento do grupo frente a acontecimentos especiais. A valorização do acontecimento é mostrada de gestos simbólicos. A festa sempre inclui algum exagero, algum desperdício: fica-se mais tempo acordado come-se, canta-se, fala-se mais alto, se gasta mais, veste-se melhor. É a alegria que se exterioriza em gestos e contagia os outros para o gozo no mesmo acontecimento.

 

c) A Intercomunhão Solidária

Sem um grupo de pessoas que valoriza o acontecimento e se comunique através de determinados gestos simbólicos, não existe festa. Não se festeja na solidão. A festa congrega, reúne pessoas que em comum valorizam da mesma forma, o mesmo acontecimento. A partir do acontecimento celebrado as pessoas se unem.

A festa é sempre fonte de solidariedade: cria e intensifica a vivência comunitária.

 

2.2. O SENTIDO DA FESTA

A festa tem sempre seu MOTIVO, MOTIVO tirado da vida. Hoje em dia como vivemos numa sociedade industrializada, onde o que conta mais é o trabalho, a produção, para compreendermos melhor o sentido da festa, precisamos compará-la com o trabalho, para ficar mais clara a diferença e a relação.

A importância que se dá ao trabalho é tão grande que atividade como a arte, o esporte e a festa são considerados trabalho. Assim, por exemplo, o jogador profissional de futebol "trabalha" quando joga. Essas, atividades passaram a ser entendida como "produção de bens simbólicos", destinadas ao consumo da massa. Por isso, tudo que não é considerado trabalho, é entendido como PREGUIÇA. Com isso se perdeu o sentido da festa, do simbólico, do gratuito, do Sacramento. A festa supõe que seus participantes vivam os mesmos valores e aceitam que é importante dedicar tempo de convivência, livres de toda pressa, toda urgência para expressar a alegria que encontram nesses valores. A festa é um "perder tempo" e nisso se opõe ao trabalho, à luta. Na festa a pessoa não produz, nem rende.

A festa pertence ao campo do inútil, do não-funcional e, portanto, do estético e do simbólico. O trabalho, a luta tem em vista o mundo a ser criado.

A festa é antecipação desse mundo a ser criado. A festa é antecipação desse mundo renovado. Por isso, ela tem um fim em si mesma, vale por ela mesma, enquanto o trabalho está direcionado para a produção. A festa não é uma atividade produtiva. Quem pensasse estar perdendo tempo como a festa teria perdido algo essencial da vida humana: o sentido da gratuidade. A festa é uma "parada".

A festa é um distanciamento do dia-a-dia que permite olhar o conjunto (e com isso o sentido do dia-a-dia). A festa representa a vida e assim permite que a vida seja assumida; mas ao mesmo tempo a relativiza e retira dela seu caráter de destino trágico e fatal para permitir que se considere e viva como história de liberdade e libertação. Significa que o mal pode ser vencido. A festa não só significa parada, pausa no trabalho diário, ela está em alternância, em contraposição com o trabalho. Isto significa que o trabalho, a luta não são capazes de assumir, nem expressar tudo o que a pessoa humana vive, e menos ainda suas aspirações e ideais. Daí a necessidade de festejar.

A festa não celebra em geral a vida como um todo, e sim o todo da vida, condensado num momento decisivo, numa encruzilhada.

Há momentos desses que são universalmente reconhecidos e festejados como tais. são momentos de transição de "passagem": o nascimento, a morte, a adolescência, o amor conjugal que se inicia, a nomeação de um chefe de um povo, as decisões importantes.

Esses momentos fortes da vida contêm sempre tensões, preocupações. Festejá-los não é ocultar as tensões e as preocupações, mas ao contrário é um meio de assumi-las e superá-las.

A festa ajuda e enfrentar as dificuldades da situação nova, surgida do acontecimento que se festeja. Por exemplo, a festa de casamento, bem celebrada, contribui para que os pais trabalhem interiormente a separação dos filhos e para que os recém-casados enfrentem a nova situação.

As tensões, as preocupações próprias a esses momentos fortes têm que aparecer na festa que os celebra. Quando são escondidos, a festa acaba perdendo seu sentido e sua profundidade. A festa só reconforta, quando toca as contradições existentes nas pessoas e nas comunidades.

Porém, o modo próprio da festa abordar as tensões e as preocupações, não é abrir chagas dolorosamente, sem anestesia, mas curá-las com alegria e esperança.

Portanto, se a festa aborda as tensões e as preocupações, é porque está intimamente ligada à vida que é feita de conflitos e tensões. Nada mais errado que pensar que festejar é ócio e até mesmo ópio, e o que importa na vida é apenas a ação, o produzir, no trabalho e na luta.

O perigo de pensar somente no trabalho, na ação, na produção é que pode levar à escravidão da produtividade e por isso atira ao desespero. A vida, as lutas históricas são sérias graves e pesadas. É preciso de quando em quando interrompê-las pelo regozijo tranqüilo na própria existência, pois a alegria de existir traz consigo a exigência de que a vida seja vida e não morte.

Quando somente se luta para transformar a sociedade pode levar à loucura, porque pouco a pouco a pessoa se vê pequena demais diante das tarefas das dificuldades dos desafios. A festa tem o dom de buscar o equilíbrio entre o grande desafio das tarefas históricas e a limitação de nossas forças.

Porém, por outro lado, festejar implica em lutar para que a vida seja melhor para todos. Pois a festa antecipa o mundo novo que nós queremos e desejamos.