O jornalista J.R. Guzzo, em artigo veiculado recentemente, expôs algumas ideias sobre a Igreja católica, que precisam ser veementemente refutadas. É o pretendo fazer nesta reflexão: aborrecer as opiniões exaradas, em total respeito à pessoa que as exarou, cujo direito de expressão é inalienável. Assim, citarei ipsis litteris algumas frases redigidas pelo articulista, para, em seguida, tecer comentários.
1) "Mas o que vale, mesmo, é a essência de sua convicção: sim, afirmou o papa, a pessoa pode ser gay e cristã ao mesmo tempo. Por que não?". O papa Francisco, no voo de retorno a Roma, aludiu à consciência, que não pode ser julgada por ninguém, só por Deus. O santo padre reportou-se à tradicional diferença entre o erro e o errante. Quem comete um pecado deve ser recebido de braços abertos, acarinhado mesmo. O pecado ou o erro, contudo, tem de ser combatido. O homossexualismo possui um parecer negativo da Igreja. Para o cristianismo, a única forma correta de viver o sexo é a heterossexualidade.
2) "Não pode [o católico] aceitar o aborto, trabalhar em pesquisas com células-tronco ou descrer de milagres ou de outras coisas que ofendem a lógica mais elementar." A Igreja, de fato, defende a vida humana desde a concepção e tacha o aborto de crime horrendo. Quem o comete é punido com excomunhão automática (cânon 1398). Quanto a trabalhar em pesquisa de células-troncos, é defeso ao católico manipular o embrião ou "brincar de Deus". Uma adequada deontologia médica balizará os lindes de atuação nessa área. O milagre demonstra a limitação da razão. Só mesmo um entrincheirado positivismo eliminaria a possibilidade do milagre.
3) "Não pode [o católico] achar que o homem vem do macaco, nem que as espécies evoluem e se transformam com o passar do tempo." A Igreja não se opõe à teoria evolucionista. Cuida-se de uma hipótese plausível, mas que não goza ainda do beneplácito conclusivo da ciência. Sem embargo, nada impediria que a dado instante da evolução da espécie humana, Deus inoculasse a alma no indivíduo. Um católico está livre para aderir tanto ao evolucionismo quanto ao criacionismo.
4) "Uma pessoa pode levar uma vida perfeitamente exemplar, do ponto de vista moral, e ser divorciada, por exemplo. Por que, então, deveria estar excluída do catolicismo?" Os divorciados não se encontram excluídos do catolicismo. Pelo contrário, a Igreja os acolhe amorosamente, através da Pastoral da Segunda União. Até da missa podem participar, assistindo ao santo sacrifício. No entanto, a indissolubilidade do matrimônio válido é um preceito de direito divino positivo, intangível. Contudo, nada obsta que um católico divorciado procure um tribunal eclesiástico, a fim de verificar se não ocorreu nulidade sacramental. E, infelizmente, muitos são os casamentos nulos.
5) "Eis aí o desafio real para a Igreja Católica de hoje: aceitar como cristã toda pessoa que viva com decência, tenha valores e se comporte segundo um código moral." A Igreja católica, fundada por Cristo há dois mil anos, se pauta nos critérios de seu divino fundador. Os referidos critérios são retirados do evangelho, inclusive do sermão da montanha, indicado como paradigma pelo articulista. Nada obstante, é necessário frisar que o cristianismo perderá seu "sabor" se se converter ao mundo. É a humanidade que é convidada a se converter ao modus vivendi cristão ou católico. O caminho proposto por Jesus nem sempre é fácil, todavia, a Igreja crê que tal caminho seja a única forma de realização cabal da pessoa humana.
O papa é filho da Igreja: palavras dele a bordo da aeronave que o conduziu ao Vaticano. No exercício do múnus de chefe da Igreja, sucessor de são Pedro, cabe a Francisco confirmar os católicos na fé, na doutrina bimilenar ensinada por Jesus Cristo, Deus encarnado. A Igreja, perita em humanidades (Populorum Progressio, n. 13), dispõe de uma proposta de "código moral". Ao largo das centúrias, vem ela apresentando à raça humana os parâmetros comportamentais que dignificam e enaltecem o ser humano, tornando-o sumamente feliz.

Edson Luiz Sampel
Teólogo e Doutor em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense, do Vaticano. Professor da Escola Dominicana de Teologia (EDT). Membro da União dos Juristas Católicos de São Paulo (Ujucasp).