Nalgumas comunidades eclesiais evita-se falar em pecado. Mas, por quê? Hoje em dia, o pecado está tão presente e atuante no mundo. Se não, vejamos. Atentemo-nos para as guerras intestinas em vários países. Observemos os inúmeros assassínios e chacinas que ocorrem dia a dia na nossa cidade, no nosso país; as falcatruas, os roubos e prevaricações libidinosas e administrativas; os crimes de trânsito impunes; a pedofilia; o sexo como mercadoria; o aborto institucionalizado... Meu Deus! Não podemos afirmar que não se perpetram pecados hodiernamente. Há-os tantos!
Em geral, nos esquecemos de um tipo de pecado: o pecado de omissão. Quando questionados, respondemos: eu não cometo pecado, pois não faço mal a ninguém. Todavia, é pecado deixar de praticar boas obras; esquivar-se do dever de socorrer o próximo, sobretudo o pobre. Jesus no-lo confirma esta doutrina no evangelho do juízo final (Mt 25, 31-46).
Ninguém soube descrever melhor a feiúra do pecado que o "imperador da língua portuguesa", pe. Antônio Vieira, SJ. Transcrevo a seguir um excerto do Sermão da Publicação do Jubileu, pregado em 1654. Ouçamos o grande jesuíta:
"Sabeis vós (...) por que não tendes ao pecado o horror e aborrecimento que o menor deles merece? É porque não conheceis a sua fealdade. Representá-la como verdadeiramente é não é possível (...).
Considerai-me uma cara (que não mereça nome de rosto, nem ainda de monstro) deformissimamente macilenta, seca e escaveirada, a cor verde-negra e funesta, as queixadas sumidas, a testa enrugada, os olhos sem pestanas nem sobrancelhas e, em lugar das meninas, duas grossas belidas; calva, remelosa, desnarigada: a boca torta, os beiços azuis, os dentes enfrestados, amarelos e podres, a garganta carcomida de alparcas, em lugar de barba um lobinho que lhe chega até os peitos, e no meio dele um cancro fervendo em bichos, manando podridão e matéria, não só asqueroso e medonho à vista, mas horrendo, pestilento e insuportável ao cheiro. Cuidais que disse alguma coisa? Do que verdadeiramente é [o pecado], nem sobras (...)."
O pecado tem de ser debelado, destruído. No lugar dele, há de vicejar a caridade, verdadeira antítese do mal. É bom que tenhamos em mente uma fotografia formidável do pecado, como a tirada por Vieira. Contudo, jamais podemos perder de vista o princípio de que o pecado tem de ser realmente odiado; já o pecador será sempre amado e respeitado.
O modo ordinário de se conseguir a absolvição do pecado é o sacramento da penitência, consoante prescreve o cânon 960. De fato, Jesus, sumamente misericordioso, instituiu o mencionado sacramento, ofertando-nos a oportunidade de lograrmos a absolvição até mesmo com uma contrição imperfeita ou atrição. Segundo o estatuído no cânon 989, todo fiel deve confessar os pecados graves, ao menos uma vez por ano.

Edson Luiz Sampel
Doutor em direito canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense, do Vaticano.
Membro da União dos Juristas Católicos de São Paulo (Ujucasp).