Tenho a certeza de prestar um serviço de amor sacerdotal e de ajudar na renovação da vida sacerdotal no momento presente da Igreja. Na Constituição Lumem Gentium, n. 28, contém o essencial sobre a natureza do sacerdócio, e no decreto sobre o ministério e vida sacerdotal contém um desenvolvimento mais amplo de tal doutrina.

No tempo que precedeu o Concílio Vaticano II e logo depois, encontrava-se entre os sacerdotes uma doutrina que nunca foi escrita e que nunca foi ensinada explicitamente. Era uma teoria que se apresentava como uma corrente de pensamento.

Alguns vendo a beleza da vocação do leigo, a beleza do seu empenho temporal e do matrimônio cristão se perguntaram: “Quem é o sacerdote?” E sustentavam, mais ou menos, que o sacerdote é um cristão como os outros, que o apostolado do sacerdote é fundamentado no Batismo e na Crisma, como para todos os cristãos e que diferença entre o sacerdote e o leigo consistia unicamente no fato que o sacerdote recebe alguns poderes necessários ao serviço do povo de Deus. Então o sacerdote seria como um leigo, mas um leigo com alguns poderes!

Ouvi um sacerdote ouvi dizer: “Eu sou contente de ser sacerdote, mas a uma condição que não deva renunciar a nada daquilo que o leigo faz”. Agora, graças aos ensinamentos do Concílio Vaticano II esta teoria não poderá mais ser admitida e nós devemos esforçar-nos para determinar melhor a natureza profunda do novo sacerdócio.

O Concílio ensina explicitamente que existe uma diferença essencial entre o sacerdócio ministerial e o sacerdócio comum dos fiéis. Veremos assim o sacerdote em relação ao Cristo, o sacerdote em relação ao Bispo e o sacerdote em relação aos leigos:

O sacerdote em relação a Cristo – segundo os ensinamentos conciliares devemos dizer que todos os cristãos recebem uma participação no sacerdócio de Cristo no Batismo e na Crisma. Ora, são sacerdotes enquanto são membros do Corpo de Cristo. Ao contrário, o sacerdócio hierárquico e ministerial comportam uma participação no sacerdócio de Cristo, enquanto Cristo é o chefe da Igreja. Em consequência, nunca se fala, de autoridade quando se trata de leigos na Igreja ao contrário, quando se trata de Bispos e de sacerdotes se fala sempre de autoridade-serviço. Por isso, não se trata de uma autoridade nossa. A autoridade da Igreja é única: é a autoridade de Cristo. Nós somos submissos a Cristo, somos ministros de Cristo. O nosso ensinamento e a nossa maneira de conduzir as almas, tudo isto depende de Cristo. Existe um sacerdócio hierárquico, quer dizer sagrado, de autoridade de Cristo; e ministerial, porque não podemos agir em nosso nome, mas no de Cristo.

Eis os textos do Concílio que ensinou explicitamente aquilo que dissera acima. “O ministério dos sacerdotes, enquanto unido à Ordem episcopal, participa da autoridade com que o próprio Cristo edifica, santifica e governa o seu corpo. Por isso, o sacerdócio dos presbíteros, supondo, é certo, os sacramentos da iniciação cristã, é, todavia, conferido mediante um sacramento especial, em virtude do qual os presbíteros ficam assinalados com um caráter particular e, dessa maneira, configurados a Cristo sacerdote, de tal modo que possam agir em nome de Cristo cabeça”. (CAPÍTULO I - O PRESBITERADO NA MISSÃO DA IGREJA, PO n. 2 – negrito nosso!). Já no n. 12 no Cap. III - A VOCAÇÃO DOS PRESBÍTEROS À PERFEIÇÃO - União com Cristo, sacerdote santo: “Pelo sacramento da Ordem, os presbíteros são configurados com Cristo sacerdote, como ministros da cabeça, para a construção e edificação do seu corpo, que é a Igreja, enquanto cooperadores da Ordem episcopal. Já pela consagração do Baptismo receberam com os restantes fiéis, o sinal e o dom de tão insigne vocação e graça para que, mesmo na fraqueza humana (1), possam e devam alcançar a perfeição, segundo a palavra do Senhor: «Sede, pois, perfeitos, como o vosso Pai celeste é perfeito» (Mt. 5, 48). Estão, porém, obrigados por especial razão a buscar essa mesma perfeição visto que, consagrados de modo particular a Deus pela recepção da Ordem, se tornaram instrumentos vivos do sacerdócio eterno de Cristo, para poderem continuar pelos tempos fora a sua obra admirável, que restaurou com suprema eficácia a família de todos os homens (2). Fazendo todo o sacerdote, a seu modo, as vezes da própria pessoa de Cristo, de igual forma é enriquecido de graça especial para que, servindo todo o Povo de Deus e a porção que lhe foi confiada, possa alcançar de maneira conveniente a perfeição d'Aquele de quem faz as vezes, e cure a fraqueza humana da carne a santidade d'Aquele que por nós se fez pontífice «santo, inocente, impoluto, separado dos pecadores» (Hb. 7,26)”.

Não se trata de uma autoridade nossa autoridade: o Papa, o Bispo e o Sacerdote não tem autoridade própria, mas participam da autoridade de Cristo, chefe da Igreja. Somos ministros de Cristo. Sempre a respeito do sacerdote em relação a Cristo, é bom sublinhar também uma outra coisa: quem recebe o sacerdócio, não recebe somente alguns poderes, mas recebe uma nova consagração. É verdade que todos os cristãos são consagrados ao Senhor, graças ao Batismo e ao Carisma, mas o Concílio ensina explicitamente que a ordem dá uma nova consagração. Devemos meditar o dever sobre esta realidade. Através de ordenação sacerdotal toda a nossa pessoa é consagrada a Cristo. Um sacerdote não se pertence mais, de maneira alguma.

Quando falamos do seu sacerdócio, não falamos de uma profissão temporal, mas de uma consagração do seu ser. Somos consagrados, quer dizer, pertencemos a Cristo apostolus, servus Jesu Christi. E isto vale para cada sacerdote. E o texto completa dizendo: Christo sacerdoti configurantur. Nesta luz nós compreendemos qual exigência espiritual que comporta esta doutrina: de ser unidos ao Cristo, d eviver em dependência e em conformidade com Cristo.

Se a graça sacerdotal é uma graça configurativa – este é o ensinamento do Concílio Vaticano II – nós devemos viver – e é ainda o Concílio Vaticano II que vem dizer-nos a forma da exigência do Evangelho (decreto sobre a formação sacerdotal, n. 8).

O sacerdote em relação aos Bispos – o ensinamento do Concílio Vaticano II é claro: certamente os sacerdotes não tem recebido a plenitude do sacerdócio como os Bispos, certamente, eles, devem viver em dependência do Bispo. Mas, o sacerdócio dos Presbíteros é da mesma natureza do sacerdócio dos Bispos. Existe uma diferença essencial entre o sacerdócio dos fiéis e o sacerdócio hierárquico e ministerial; existe somente uma diferença de gerar e de dependência entre o sacerdócio dos presbíteros e o sacerdócio dos Bispos.

O texto da Lumen Gentium diz, n. 28: “Os presbíteros, embora não possuam o fastígio do pontificado e dependam dos Bispos no exercício do próprio poder, estão-lhes, porém, unidos na honra do sacerdócio (100) e, por virtude do sacramento da Ordem (101), são consagrados, à imagem de Cristo, sumo e eterno sacerdote (Hebr. 5, 1-10; 7,24; 9, 11-28), para pregar o Evangelho, apascentar os fiéis e celebrar o culta divino, como verdadeiros sacerdotes do Novo Testamento (102)”. E a consequência: “Os presbíteros, como esclarecidos cooperadores da ordem episcopal (108) e a sua ajuda e instrumento, chamados para o serviço do Povo de Deus, constituem com o seu Bispo um presbitério (108) com diversas funções”.

No Decreto sobre o Ofício Pastoral dos Bispos se diz que a Diocese é uma porção do Povo de Deus, confiada a um Bispo auxiliado pelo seu presbitério (Cân. 369). Não só ao Bispo, mas ao Bispo com os sacerdotes. Este é o pensamento do Concílio, cf. Christus Dominus, Cap. II, n. 11). Tal doutrina, que é também Tradição na Igreja, deve ser renovada, elucidada e melhor determinada. Devemos ainda nos referir quando falaremos da espiritualidade do sacerdote e da força da obediência sacerdotal, mas já podemos dizer que a união dos sacerdotes entre eles e a união dos sacerdotes com o Bispo encontram o seu fundamento na Ordem sacerdotal. A obediência do clero, não será então uma obediência disciplinar, mas algo de muito mais profundo e eficaz.isto tem como consequência que os presbíteros entram, de maneira própria, na colegialidade dos Bispos: cooperatores ordinis nostri - cooperadores não só dos Bispos, mas do Episcopado. E por isso o Concílio aplica aos presbíteros a apalavra de São Paulo: Sollicitudo omnium ecclesiarum.

Assim compreendemos sobre qual fundamento se apoia o nosso sacerdócio hierárquico e ministerial: existe um só sacerdote, Cristo, e o Cristo, chefe da Igreja, quer servir-se de nós para continuar a sua obra.

O sacerdote em relação aos leigos – o sacerdócio é um ministerium, por isso devemos compreender todos as dimensões do nosso sacerdócio para poder situar-se bem, além de em relação a Cristo e aos Bispos, também em relação aos Leigos.

Consideramos alguns aspectos. Somos irmãos como todos os membros do Povo de Deus. Somos membros porque, como todos, somos discípulos de Cristo. Eis o texto do Concílio Vaticano II: “Embora os sacerdotes do Novo Testamento, em virtude do sacramento da Ordem, exerçam no Povo e para o Povo de Deus o múnus de pais e mestres, contudo, juntamente com os fiéis, são discípulos do Senhor, feitos participantes do. seu reino pela graça de Deus que nos chama, Regenerados com todos na fonte do Batismo, os presbíteros são irmãos entre os irmãos, membros dum só e mesmo corpo de Cristo cuja edificação a todos pertence”. (PO, n. 9).

O concílio cita também o famoso texto no qual Santo Agostinho diz a sua segurança enquanto irmão no meio dos irmãos e toda a sua ansiedade para a com a responsabilidade que lhe é de peso como Bispo. Vejamos: “Os leigos, portanto, do mesmo modo que, por divina condescendência, têm por irmão a Cristo, o qual, apesar de ser Senhor de todos, não veio para ser servido mas para servir (cfr. Mt. 20,28), de igual modo têm por irmãos aqueles que, uma vez estabelecidos no sagrado ministério, apascentam a família de Deus ensinando, santificando e governando com a autoridade de Cristo, de modo que o mandamento da caridade seja por todos observado. A este respeito diz belissimamente S. Agostinho: «aterra-me o ser para vós, mas consola-me o estar convosco. Sou para vós, como Bispo; estou convosco, como cristão. Nome de ofício, o primeiro; de graça, o segundo; aquele, de risco; este, de salvação»”. LG, n. 32.

A nossa segurança é de ser membros do Povo de Deus, porque como todos os outros fomos salvos por Cristo, porque consigamos como todos os outros aproveitar dos sacramentos da Igreja, porque podemos contar com o apoio fraterno de todos os outros: somos irmãos. E ainda porque, como irmãos, possamos sempre dialogar com os leigos.

Somos padres e mestres: “… munus patris et magistri exerceant” (PO, n. 9). E como, só Deus é verdadeiro Pai Celeste, nós somos padres enquanto comunicamos não a nossa vida, mas a vida de Deus. Somos entre os homens o sinal da presença do Pai Celeste: comunicamos a vida de Deus. Então quando os homens nos chamam de Padre, devemos fixar os olhos no Pai Celeste.

Isto cria para nós uma experiência de amor. Devemos ter cuidado para com todos, especialmente por aqueles aos quais fomos enviados para anunciar-lhes o Evangelho. Se devemos ter em nós um amor de Pai, devemos ter presente o Pai que não condena os seus filhos, mas os quer salvar. Nesta imagem de Pai nós nos sentimos também pastores e o Bom Pastor dá a alma e a sua vida para suas ovelhas.

O Concílio diz que somos não só Pais, mas também mestres. Mas há um só Mestre: Cristo. Por isso não temos o direito de ensinar a nossa gente as nossas opiniões ou as ideias deste ou daquele mestre humano. A doutrina que devemos dar a nossa gente é a Doutrina do Divino Mestre Jesus.

Certamente são muito uteis as pesquisas dos teólogos e através destas opiniões e estudos, pouco a pouco faz o seu processo também a ciência sociológica, mas o pastor não deve comunicar pesquisas, mas sim a doutrina da Igreja. Não somos nós os mestres, existe um só Mestre: Cristo. Eis, então a atitude que devemos assumir a respeito dos fiéis.

Somos servidores. É um tema central do Concílio Vaticano II: somos servidores!!! Eis o texto conciliar: “Devem os presbíteros de tal modo estar à frente que, não procurando os próprios interesses mas os de Jesus Cristo (53), trabalhem na obra comum com os leigos e vivam no meio deles segundo o exemplo do Mestre, que «veio» para o meio dos homens, «não para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de muitos» (Mt. 20,28). Os presbíteros reconheçam e promovam sinceramente a dignidade e participação própria dos leigos na missão da Igreja. Estejam dispostos a ouvir os leigos, tendo fraternalmente em conta os seus desejos, reconhecendo a experiência e competência deles nos diversos campos da atividade humana, para que, juntamente com eles, saibam reconhecer os sinais dos tempos. Sabendo discernir se os espíritos vêm de Deus (54), perscrutem com o sentido da fé, reconheçam com alegria e promovam com diligência os multiformes carismas dos leigos, tanto os mais modestos como os mais altos. Entre os demais dons de Deus que se encontram com profusão entre os fiéis, são dignos de especial atenção os que atraem a uma vida espiritual mais alta. Entreguem-se aos leigos, com confiança, obras do serviço da Igreja, deixando-lhes espaço e liberdade de ação, convidando-os oportunamente a que tomem eles as suas iniciativas (55).

Os presbíteros, finalmente, foram postos no meio dos leigos para os levar todos à unidade «amando-se uns aos outros com caridade fraterna, e tendo os outros por mais dignos» (Rom. 12, 10). É, pois, dever deles congraçar de tal maneira as diferentes mentalidades que ninguém se sinta estranho na comunidade dos fiéis. São os defensores do bem comum do qual têm cuidado em nome do Bispo, e simultâneamente reivindicadores da verdade para que os fiéis não se deixem enredar por qualquer doutrina (56). São-lhes confiados com peculiar solicitude os que se afastaram da prática dos sacramentos e sobretudo da fé, dos quais, como bons pastores, não deixarão de se aproximar.” (PO, n. 09 – negrito nosso).

Reencontramos este ensinamento também no Captíulo IV da Gaudium et Spes e nos textos sobre os leigos. Somos servidores da justiça, da verdade e do amor, do nosso Mestre e Senhor.

O Serviço sacerdotal é uma grandeza. Fazendo-se servidor, o sacerdote mostra aos homens a figura de Cristo, Mestre e Senhor, que quis ser servidor.

Eis, pois, alguns aspectos do nosso sacerdócio: a respeito de Cristo, a respeito do Bispo e a respeito dos leigos.

 

No próximo veremos ... o sacerdote no mundo ...