Celebramos neste domingo a solenidade de Cristo Rei do Universo. A Palavra de Deus que nos é proposta para este último domingo do ano litúrgico nos convida a tomar consciência da realeza de Jesus. Deixa claro, no entanto, que essa realeza não pode ser entendida à maneira dos reis deste mundo: é uma realeza que se concretiza de acordo com a vontade de Deus. 

O texto evangélico nos apresenta uma cena do processo de Jesus diante de Pilatos, o governador romano da Judéia, que desempenhou o seu ofício entre os anos 26 e 36.  O dramático interrogatório começa com uma pergunta de Pilatos: “Tu és o Rei dos judeus?” (v. 33).  Esta pergunta revela qual era a acusação apresentada pelas autoridades judaicas contra Jesus: Ele tinha pretensões messiânicas; pretendia restaurar o reino de Davi e libertar Israel dos opressores. Com a sua resposta, Jesus se apresenta como o Messias que Israel esperava e confirma a sua identidade de rei (v. 36).

Contudo, sabe-se que os reis deste mundo apoiam-se na força das armas e impõem aos outros o seu domínio e a sua autoridade; a realeza desses reis baseia-se no poder e na ambição, podendo gerar injustiça e sofrimento.  Mas Jesus é um rei diferente, é prisioneiro, indefeso e abandonado pelo povo. Ele não se impõe pela força, mas veio ao mundo para amar a todos e a todos servir, em total conformidade com a vontade do Pai.  A realeza de Jesus procede de Deus. Na narração da Paixão, pode-se observar como os próprios discípulos, apesar de terem partilhado a vida com Jesus e ouvido as suas palavras, pensavam num reino político, instaurado mesmo com o uso da força (cf. Jo 18,10-11).

No Evangelho deste domingo, Pilatos pergunta a Jesus: “Tu és o rei dos judeus?”, e Jesus responde: “Tu o dizes, eu sou Rei” (v. 37). Jesus reforçou esta resposta, citando e aplicando a si mesmo aquilo que o profeta Daniel havia dito do Filho do homem que vem entre as nuvens do céu e recebe o reino que nunca passará, como consta na primeira leitura (cf. Dn 7,13s). Uma visão grandiosa na qual Cristo aparece dentro da história e acima dela, temporal e eterno. 

Pilatos não consegue entender que um rei renuncie ao poder e à força e fundamente a sua realeza no amor e na doação da própria vida.  Jesus confirma a sua realeza e define o sentido e o conteúdo do seu reinado: “Dar testemunho da verdade” (v. 37). Para o Evangelista São João, a “verdade” é a realidade de Deus. Essa “verdade” manifesta-se nos gestos de Jesus, nas suas palavras, nas suas atitudes e, de forma especial, no seu amor vivido até ao extremo do dom da vida. Essa verdade opõe-se à mentira, que é o egoísmo e o pecado, ou seja, tudo aquilo que empalidece a vida do homem e o impede de ser feliz. 

O drama que se desenrola no palácio de Pilatos é o drama da humanidade que procura onde está a verdade. Jesus disse inicialmente: “Eu vim ao mundo para dar testemunho da verdade” (v.37). A verdade só pode ser encontrada em Jesus, pois só ele é o “caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6).

No centro deste percurso de revelação da realeza de Jesus Cristo está mais uma vez o mistério da sua morte e ressurreição. Jesus entregou-se livremente à sua paixão e morte de cruz, em total obediência à vontade do Pai. É, precisamente, oferecendo-se a si mesmo no sacrifício de expiação, que Jesus se torna o Rei do Universo, como Ele mesmo declarará ao aparecer aos Apóstolos depois da ressurreição: "Foi-me dado todo o poder no céu e na terra" (Mt 28, 18). 

Seu poder é o poder divino de dar a vida eterna, de libertar do mal, de derrotar o domínio da morte. É o poder do amor, que do mal sabe obter o bem, enternecer um coração endurecido, levar paz ao conflito mais áspero, acender a esperança na escuridão mais cerrada. Cristo veio para "dar testemunho da verdade" (Jo 18, 37), como declarou diante de Pilatos. Escolher Cristo nos assegura aquela paz e alegria que só Ele pode dar.

Cristo é a verdade. E esta verdade é Cristo. A verdade de Cristo verificou-se na vida dos santos de todos os séculos. Os santos constituem o grande vestígio de luz na história, que assegura: Esta é a vida, este é o caminho, esta é a verdade.  Assim aconteceu com São Paulo, com São Bento, com São Francisco de Assis e muitos outros santos. Eles ouviram no coração a voz de Cristo. Compreenderam que Cristo os chamavam para uma missão. Tal é a consequência deste primeiro encontro com a voz de Cristo.  É a imagem de Cristo Crucificado e Ressuscitado, vida da Igreja, como há dois mil anos falou aos seus apóstolos e também hoje fala a cada um de nós.

A Virgem Maria se associou de maneira singular à realeza de Cristo.  E neste dia em que celebramos a Solenidade de Cristo Rei do Universo, peçamos também a ela, a humilde jovem de Nazaré, a quem Deus confiou a maternidade de seu divino filho e tendo sido exaltada e coroada como a Rainha do Céu e da Terra, que ela interceda por cada um de nós, para que o amor de Deus possa reinar em todos os corações e se cumpra o seu desígnio de justiça e de paz. 

Que saibamos ser imitadores de Jesus, que diante de Pilatos, na situação humilhante descrita pelo Evangelho, manifestou a sua glória: a glória de amar até o fim, dando a própria vida por todos. E que possamos também dizer todos os dias, como repetimos na oração do Pai Nosso: “Venha a nós o vosso reino”.  E que seguir Jesus, nosso Rei, e dar testemunho dele com toda a nossa existência.  Assim seja. 

D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB