O Concílio Vaticano II, de um modo geral, frisa que é papel do leigo, não do padre, atuar diretamente na política partidária. Eis o que estatui a constituição dogmática Lumen Gentium: “É, porém, específico dos leigos, por sua própria vocação, procurar o reino de Deus, exercendo funções temporais, e ordenando-as segundo Deus.” (n. 31b). A secularidade dos leigos, caríssima aos integrantes do concílio, é juridicamente confirmada pelo código canônico. Leia-se a tradução do cânon 225, § 2.º: “Têm [os leigos] também o dever especial, cada um segundo a própria condição, de animar e aperfeiçoar com o espírito evangélico a ordem das realidades t emporais e, assim, dar testemunho de Cristo, especialmente na gestão dessas realidades [como deputado, senador, vereador, prefeito, governador, presidente etc.] e no exercício das atividades seculares.”
               O Catecismo da Igreja Católica perfilha a mesma concepção sobre o múnus do leigo: “A iniciativa dos cristãos leigos é particularmente necessária quando se trata de descobrir, de inventar meios para impregnar as realidades sociais, políticas e econômicas com as exigências da doutrina e da vida cristãs.” (n. 899). Na verdade, o aludido catecismo é contundente: “Não cabe aos pastores da Igreja intervir diretamente na construção política e na organização da vida social. Esta tarefa faz parte da vocação dos fiéis leigos, que agem por própria iniciativa com seus concidadãos.” (n.º 2442).  
            O ordenamento jurídico da Igreja é cioso da vocação própria dos leigos no campo da política institucional; proíbe aos clérigos atuarem nessa área. Esta a tradução do cânon 287, §2.º: “Não tenham [os clérigos] parte ativa nos partidos políticos e na direção de associações sindicais, a não ser que, a juízo da autoridade eclesiástica competente, o exijam a defesa dos direitos da Igreja ou a promoção do bem comum.”
            O povo de Deus precisa dos padres administrando sacramentos; e não elaborando projetos de lei ou exercendo funções estatais. Há falta de presbíteros! Só mesmo uma convulsão nacional, atualmente, justificaria a autorização de um bispo para um clérigo assumir cargo de vereador ou outra atividade pública.  
            Será que em algumas dioceses não há leigos qualificados para as funções de vereador, prefeito etc.? É lógico que há! Por que, então, não propor esses nomes?
            Respondendo à pergunta formulada no título deste artigo, o padre, em tese, pode exercer um cargo público (em casos gravíssimos, objetivamente justificados pelo bispo), mas não deve, porque a política é função do leigo. E há muitos leigos competentes e preparados.  

Edson Luiz Sampel
Professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo (da Arquidiocese de São Paulo). Autor de "Questões de Direito Canônico" (Paulinas).