O direito canônico é indispensável à comunidade católica. De fato, não se deve encarar a lei como obstáculo à prática do amor e da caridade. Muito pelo contrário! A norma jurídica objetiva criar o pano de fundo essencial para a vivência dos valores evangélicos. Os ideários encontradiços no Concílio Vaticano II seriam letra morta, não fosse o código canônico a dar-lhes pujança e viabilidade. Em suma, a lei canônica tem o condão de facilitar a caminhada do povo de Deus.
A Maria santíssima tributamos o culto denominado hiperdulia. Rendemos à mãe de Jesus altissonantes honras. É óbvio que a lei eclesiástica não poderia deixar de tratar de certos aspectos do papel de Maria na economia da salvação. Por isso, há cânones a propósito do culto devido a nossa Senhora.
O cânon 246, parágrafo 3.º, determina que no seminário se incentive o culto à bem-aventurada virgem Maria, através da reza do rosário. Com efeito, ao se aproximarem da simplicidade de Maria, os seminaristas, meditando a respeito da história dela, adquirirão as virtudes marianas, sobretudo a capacidade de ouvir e observar atentamente.
O direito canônico salvaguarda esses bens marianos augustíssimos. Desta feita, quando regulamenta os deveres dos clérigos, reporta-se à necessidade da entrega total aos braços de Maria. Assim, os membros da hierarquia são solicitados a cultuarem com especial veneração a virgem mãe de Deus (cânon 276, parágrafo 2.º). É muito bonita esta perfeita simbiose entre direito e santificação. Ao primeiro súbito de vista, o direito tange às questões meramente externas, de relacionamento entre as pessoas no grêmio da Igreja católica. Contudo, ao se admoestar os clérigos ao amor de Maria, o natural, isto é, a rotina diária é perpassada pelo sobrenatural, ou seja, realiza-se a chamada comunhão dos santos.
Os religiosos, isto é, as freiras, os irmãos e congêneres, são instados a rezar o terço, honrando a virgem Maria, modelo e proteção da vida consagrada (cânon 663,§4.º).
Na verdade, todos os membros da Igreja, leigos e clérigos, são convidados a haurir na hiperdulia a fonte inexaurível de santificação. Neste sentido, o cânon 1186 recomenda a devoção especial e filial dos fiéis à mãe de Jesus. Sem sombra de dúvida, só quem reza o santo rosário quotidianamente pode testemunhar os ingentes benefícios desta devoção.
Maria é o modelo de obediência à lei de Deus e de amor aos pobres. A lei canônica, querendo tornar exequível a doutrina de Jesus, bem como o desejo dele da construção de uma sociedade justa e fraterna, cria os mecanismos imprescindíveis em favor do culto de Maria santíssima.

Edson Luiz Sampel
Professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo (da Arquidiocese de São Paulo). Acaba de lançar o livro "Noções de Direito Constitucional Canônico" (prefácio do prof. dr. dom Hugo Cavalcante, OSB), pela editora Santuário, de Aparecida.