A CNBB, em sua 51ª Assembleia Geral Ordinária, que se realizou na cidade mariana de Aparecida, entre os dias 10 e 19 de abril deste ano, aprovou que fosse estudado e aprofundado o tema central da Assembleia: "Comunidade de comunidades: uma nova paróquia", e para isso foi publicado, em forma dos assim chamados "estudos da CNBB", sob o número 104, para ser refletido em todas as nossas paróquias, comunidades e grupos de reflexão.
Foi facultado que as contribuições acerca deste importante documento deverão ser encaminhadas para a sede da CNBB, em Brasília, até o dia 15 de outubro próximo, tendo em vista que estas contribuições serão assimiladas para o documento, que será submetido à apreciação, discussão e votação dos nossos irmãos Bispos, na 52ª Assembleia Geral da CNBB, que será celebrada de 30 de abril a 09 de maio de 2014.
A Igreja nos convida a partir do pensamento central da V Conferência Geral do Episcopado Latino Americano e Caribenho, de 2007, que diz: "Ser Discípulo e Missionário de Jesus Cristo, para que nele nossos povos tenham vida". Este pensamento nos leva a uma "conversão pastoral", abandonando um caminho e escolhendo outro, quando somos instados a "ultrapassar uma pastoral de mera conservação ou manutenção para assumir uma pastoral decididamente missionária" (DGAE, n. 26). Nossas paróquias precisam se renovar. É o chamado constante do Papa Francisco para irmos às periferias existenciais do mundo para proclamar Jesus Cristo como Senhor.
O estudo 104 é dividido em três capítulos. Teremos muitas correções e sugestões a fazer, mas hoje gostaria de expor um pouco desse estudo destinado a tornar-se documento da Igreja do Brasil. No primeiro capítulo, o documento parte da perspectiva bíblica da vida paroquial. Nossas comunidades devem estar focadas nas Sagradas Escrituras. A leitura orante da Bíblia, a intimidade com a Palavra de Deus, a experiência orante nos conduz a contemplar e a viver a missão de Jesus, que é a missão de todos os batizados. Nesse sentido somos convidados a ter intimidade com a oração, com o retiro, a exemplo de Jesus que passou quarenta dias no deserto, fortalecendo-se na sua missão como Servo de Deus e Filho do Homem que resgata o seu povo.
É interessante que ainda temos barreiras ideológicas para serem vencidas em tantas situações de não aceitação do trabalho pastoral, que deve ser cada vez mais vivido, como a questão da leitura orante da Sagada Escritura. Sabemos também que muitos grupos de reflexão e círculos bíblicos são sementes de novas comunidades na paróquia para melhor sermos presenças em nosso território paroquial.
Jesus, em sua pregação, nos chama de amigos, de irmãos e irmãs, havendo igualdade entre homem e mulher, partilha dos bens, superando toda a mentalidade de superioridade de um em função de outro, sendo que na Igreja todo poder é exercido como serviço. Nossas comunidades são convidadas a testemunhar a misericórdia de Deus, pregação que nos fascina no testemunho do Santo Padre Francisco, quando a Igreja é chamada a testemunhar o perdão e a reconciliação. A oração comunitária, dos reconciliados, é a oração eclesial de quem serve com alegria. Nossas Paróquias devem passar por uma mudança de mentalidade, empregando quatro fontes primordiais em todo trabalho pastoral e evangelizador: 1) hospitalidade; 2) partilha; 3) comunhão de mesa e 4) acolhida dos Excluídos. Estas quatro metas sustentam a vida comunitária, a exemplo de Jesus, o Bom Pastor, que nos ensina a recuperar a dimensão "caseira da fé", a dimensão da família que testemunha a sua fé primeiramente em casa. Por isso, somos chamados a valorizar a dimensão da missa dominical em nossas comunidades, não apenas nas Igrejas Matrizes. O cuidado com os doentes e o anúncio do Reino de Deus para todos e não somente para os santos, já que "Jesus supera as barreiras de sexo, de religião, de etnia e de classe. Ele não se fecha dentro da sua própria cultura, mas sabe reconhecer as coisas boas que existem em todas as pessoas" (cf. Estudos da CNBB 104, número 26).
Jesus mesmo foi um peregrino. Ele "começou a andar por todos os povoados da Galiléia anunciando o Reino ao povo de Deus" (cf. Mc 1,14-15). Isso é o que nós devemos fazer hoje, sem medo de ir ao encontro das periferias urbanas e daqueles que estão afastados de nossas estruturas paroquiais. Acolher e ir. Acolher os que estão retornando e ir ao encontro daqueles que querem ser aquecidos, mas não conseguem saber onde.
Jesus veio para os pobres, os doentes, os pecadores. Isso causou resistência naquele tempo, e nos dias de hoje parece que estamos na contramão da sociedade. Mas não estamos! Os pobres, os doentes, os pecadores, as crianças e os idosos são prioridades de nossa ação pastoral, porque "Na Páscoa de Jesus, a morte foi vencida. O Cristo ressuscitou como o primeiro dentre os mortos. Todo aquele que nele crer não morrerá, mas terá a vida eterna" (cf. Jo 3.36). "Os cristãos serão missionários da vida plena e da salvação que Cristo realizou na cruz. Ela suscita a fé em Cristo para que todos tenham vida em seu nome" (cf. Jo 20,30).
"Os apóstolos criaram comunidades nas quais a essência de cada cristão se define como filiação divina. Esta se dá no Espírito Santo pela relação entre fé e batismo. É o Espírito quem realiza nos corações a condição para que alguém se torne seguidor de Jesus Cristo, filho de Deus, e membro da comunidade cristã" (cf. Estudos da CNBB 104, n. 34).
Ouvindo os ensinamentos dos apóstolos, vivendo a comunhão fraterna, partindo o Pão pela celebração e participação da Santa Eucaristia e no afeto da oração a nossa comunidade se transformará em "comunidade de comunidades".
Como os apóstolos viveram, no seu tempo, muitas tensões, conflitos e perseguições, esta realidade se torna atual. Por isso, os missionários são chamados a evangelizar em grupos para superar as dificuldades da pós-modernidade. Os católicos devem ser identificados por viverem em comunhão e partilha.
A Igreja fundamenta sua vida comunitária na perspectiva trinitária. Muito bem nos ensina o Papa Francisco no seu discurso aos Bispos do CELAM: "Aparecida propôs como necessária a Conversão Pastoral. Essa conversão implica acreditar na Boa Nova, acreditar em Jesus Cristo portador do Reino de Deus, em sua irrupção no mundo, em sua presença vitoriosa sobre o mal; acreditar na assistência e guia do Espírito Santo; acreditar na Igreja, Corpo de Cristo e prolongamento do dinamismo da Encarnação"
Vamos renovar nossas comunidades, tornando-as comunidade de comunidades, indo ao encontro dos mais afastados e levando a alegria que ninguém pode nos tirar: Jesus Cristo Vivo e presente no meio de nós!
† Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ